..(Série Histórias e Lendas).. O ATAQUE DO LOBISOMEM

José  Luiz  Mendes  Gomes

Aconteceu  numa  cidadezinha,  tímida,  pacata  ( pacata até a  ocorrência inusitada ).  Silveirópolis, nunca ninguém soube explicar a razão do nome, talvez quem a tenha fundado tivesse sido um tal de Silveira, diriam opiniões mais afoitas, enfim. Era Silveirópolis. Até aí, tudo bem. Só que, por ironia do destino, Silveirópolis oferecia uma das melhores oportunidades da região para a construção de uma Barragem.  Num raio de 3000  quilômetros não havia possibilidade igual.  Pra encurtar a conversa, resolveram pela construção da Barragem de Silveirópolis.  E assim foi.  Começaram  os  preparativos, chegaram os primeiros funcionários, que, até a conclusão dos alojamentos, ficariam pernoitando na Pensão Sol Poente, a única da cidadezinha, atendia um ou outro caminhoneiro, que se perdia no trajeto e acabava passando por Silveirópolis.  Para os funcionários mais graduados, engenheiros e técnicos, a empreiteira alugou um casarão na área nobre da cidade, que de nobre só tinha o fato de situar-se na única rua pavimentada do lugarejo. Entre esses funcionários, estava Ricardão, sujeito bem apresentável, partidário de uma cervejinha com os amigos nos fins de semana. Não se sabe se chamado por Ricardão devido ao porte físico e conseqüentemente cognominado assim pelo fato de chamar-se Ricardo, ou se por motivos óbvios inerentes à visitas técnicamente planejadas em lares alheios, já que sua função na empresa era justamente na área de planejamento. Mal chegou na cidadezinha, seus olhos de lince já aventava possibilidades. Não passou uma semana, já havia identificado e sacramentado sua primeira investida. Não era de perder tempo. Uma conversa aqui, outra ali, em  encontros casuais e “crau”. Sinal verde para a operação. Alguns amigos mais íntimos ainda aconselharam, uma semana só na cidade e já invadindo privacidade alheia? Não adiantaram as advertências, lançou-se a planejar a investida, de acordo com algumas informações importantes já conseguidas nos primeiros xavecos, he,he,he.  Planejou data, horário, consultou a meteorologia, uma vez que andou caindo aguaceiros nos últimos dias, deixando as ruas de barro vermelho enlameadas, planejou acessos e por fim, não podia esquecer da segurança, planejou rotas de fugas, que não podiam ser ignoradas. Enfim, tudo planejadinho, como planejava as obras, pra não ter erro. Chegou o dia “D”, não estava chovendo, mas chovera no dia anterior. Era noite de lua cheia. Quando a cidade dormia, lançou-se ao empreendimento. Chegou ao local, olhou ao redor para certificar-se se não havia olhares furtivos ( procedimento essencial  para o sucesso da operação ), e lançou-se ao desafio: Três batidinhas intermitentes seguidas de três batidinhas contínuas com a mão fechada era a senha, ou seja:  Toc… toc … toc… ,   toc, toc, toc.  Foi o suficiente para a janela abrir-se, como num passe de mágica e ele impulsionar-se para adentrar o recinto, entretanto, como em todo planejamento algo fica a desejar, não havia “levantado em sua vistoria técnica à distância” que aquele peitoril tinha altura um pouco acima do convencional, e assim, acabou por cair, mas numa manobra ardilosa, caiu de quatro e não se sujou no quintal enlameado, mas as mãos e o coturno (ele gostava de usar coturno, desde o tempo que serviu o exército e o coturno que usava salvara-lhe a vida, obviamente em um caso semelhante ), ficaram cheios de barro vermelho. Não esmoreceu, olhou para o peitoril e como um touro bravo, impulsionou-se novamente, com a certeza de que, atrás daquele peitoril estático, havia um outro “peitoril que não era um parapeito, mas sim um “peito para” ele, aliás, dois, corrigiria ele pensativo. Só que a segunda tentativa quase fracassa, aquele não era seu dia, quer dizer, aquela não era sua noite. Ao apoiar-se no peitoril, uma de suas mãos escorregou pela parede, por pouco não cai novamente, sorte que deu para firmar-se com a outra mão e adentrar finalmente o recinto sagrado, planejado criteriosamente. Óbviamente não temos informações do ocorrido atrás daquela janela, mas, um fato inusitado ocorreu:  No dia seguinte, quando eu e ele caminhávamos pela rua para irmos para o escritório da obra, avistamos um multidão  ( proporcionalmente falando em relação à cidadezinha ) em frente justamente da  casa que o dito cujo visitara, com cada um querendo dar sua opinião sobre alguma coisa que ainda não sabíamos. Uma coisa terrível passou pela minha cabeça, enquanto Ricardão abria caminho e seguia para ver de perto o que havia ocorrido.  Será que meu amigo Ricardão exagerara na dose? Meus Deus! Felizmente deixei o pensamento pra lá quando vi Ricardão lá na frente da multidão e me chamando, com um sorriso sarcástico entre-lábios. Quando consegui passar, avistei sob o peitoril uma enorme mão avermelhada, da cor da argila do solo, uma verdadeira manopla. E a multidão em discussão uns com os outros, em concordância geral que o Lobisomem, que era lenda respeitada naquela cidade,  tinha aparecido mais uma noite para tentar  (?) invadir lares incautos. Saímos em direção ao escritório, mas antes de chegar, ainda fomos parados por um veículo da emissora de televisão da cidade vizinha que vinha cobrir o fato. Uma loira exuberante abriu o vidro e Ricardão se adiantou à atender, óbviamente. A repórter perguntou pelo local onde o Lobisomem tinha atacado, ao que foi orientada. Disse que iriam fazer a reportagem e ficar na cidade mais uns dias para um documentário. Ricardão então colocou-se à disposição para relatar detalhes sobre o ocorrido  ( não sei e acho que nem a repórter poderia achar que detalhes seriam estes ).  Trocaram telefones, nós seguimos para a obra, eles seguiram para o local do suposto ataque (?).

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